Desafio do tamanho do Brasil - SISPRO
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Desafio do tamanho do Brasil

CARÊNCIA DE PESSOAL TREINADO A SSOCIADA À NECESSIDADE DE IDENTIFICAR E AVALIAR BENS PÚBLICOS DIFICULTA A CONVERGÊNCIA GOVERNAMENTAL

FERNANDA BALIEIRO

Qual é a real dimensão do patrimônio imobiliário e dos bens de infraestrutura da União, dos Estados e municípios brasileiros? E de seus passivos? Como a contabilidade pública sempre esteve restrita ao processo orçamentário e ao registro pelo regime de caixa, os entes federativos nunca se ocuparam da mensuração do patrimônio e das dívidas públicas. Isso deve mudar. Com a convergência brasileira aos padrões da contabilidade pública internacional, esse tipo de informação ficará acessível. O prazo para os entes da Federação enviarem seus planos de contas e demonstrações contábeis é o final do atual exercício, de 2014. A segunda etapa da convergência, mais analítica, está prevista para 2015 ou, no máximo, 2016, levando-se em conta certa flexibilidade da STN – Secretaria do Tesouro Nacional ao acompanhar os desafios de cada região.

Alguns Estados estão adiantados nesse processo – Minas, por exemplo, já atingiu o 15º nível de exigência de consolidação do Plano de Contas (a STN exige até o quinto nível) com a atualização completa de seus bens móveis e imóveis, tudo avaliado no valor presente. No entanto, outras regiões ainda lutam com a falta de informações e de profissionais especializados. Mais importante até que a tecnologia, o investimento em recursos humanos se mostra primordial para o sucesso da convergência, que trará mais confiabilidade ao Governo e ainda será uma boa ajuda na tomada de decisões.

Mais controle e maior eficiência

A nova cultura contábil, focada no patrimônio, emana das Normas Brasileiras de Contabilidade Aplicadas ao Setor Público, editadas pelo CFC – Conselho Federal de Contabilidade, com base nas normas contábeis internacionais aplicadas ao setor público. Além de favorecer o intercâmbio de dados financeiros entre o Brasil e outros países, as demonstrações contábeis refletirão o impacto econômico das decisões políticas, a eficiência do setor público e auxiliarão o gerenciamento de bens. “Imagine que você foi eleito prefeito e não tem ideia de quais bens dispõe ou da depreciação de seus imóveis. Com essas informações em mãos, será fácil identificar o que não está sendo utilizado e pode ser vendido para gerar recursos ou o que deve receber manutenção”,  explica Kieran McManus. Ele e Agenor B. Duarte Jr. foram os orientadores do curso específico sobre esse tema promovido pelo Ibracon em 2013.

Conforme estabelecido pela Secretaria do Tesouro, órgão regulador da convergência, por meio da Portaria 634/2013, até o término do exercício de 2014, todos os órgãos e entidades da Federação deverão adotar o Plano de Contas Aplicado ao Setor Público e as Demonstrações Contábeis Aplicadas ao Setor Público. Aqueles que descumprirem o plano de contas podem ser impedidos de receber transferências voluntárias, de contratar operações de crédito e de obter garantias da União para a contratação de operações de crédito externo.

Já os Procedimentos Contábeis Patrimoniais, que compreendem o reconhecimento, a mensuração, o registro, a apuração, a avaliação e o controle do patrimônio público – bens móveis, imóveis, intangíveis, infraestrutura e patrimônio histórico – terão prazos finais de implantação estabelecidos gradualmente por meio de portarias, de forma que todas as regiões estejam alinhadas.

Nelson Machado, professor da Escola de Economia da Fundação Getúlio Vargas, integrante do Grupo Assessor da Contabilidade Aplicada ao Setor Público do CFC e ex-ministro da Previdência Social, aponta que, nessa segunda etapa do processo, o passo

mais relevante seria aplicar todos os esforços para reconhecer os créditos tributários do regime de competência.

“Isso ampliaria fortemente o controle do setor público e da população sobre as receitas a receber de Estados, municípios e União”, esclarece o profissional. Ele ainda sugere mais um item na lista de prioridades: a identificação e avaliação do ativo imobilizado. “Se você for a qualquer Estado e pedir a lista dos bens, não vai achar com facilidade”, expõe.

O professor conta que, quando começaram as discussões sobre a convergência, em 2008, havia um excesso de otimismo com relação ao tempo de conclusão. Contudo, os desafios começaram a surgir, entre eles a falta de informações, de qualificação profissional e de processos preparados para atender aos requisitos da nova norma. “A convergência é um desafio muito grande devido ao volume de entidades, informações e até pessoas envolvidas. Na Inglaterra, o processo completo levou cerca de dez anos”, acrescenta McManus.

Minas lidera a convergência no Brasil

Minas Gerais, Santa Catarina, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, São Paulo, Alagoas, Pernambuco, Pará e Paraíba são os Estados precursores na convergência.

Alguns estão mais avançados, como é o caso de Minas Gerais.

O processo de convergência mineiro começou bem cedo. O Plano de Contas passou a ser trabalhado em 2011, mas as discussões do grupo de trabalho interno junto à Secretaria do Tesouro Nacional foram iniciadas em 2008.

“Minas já tinha diversas ações em desenvolvimento visando ao reconhecimento dos ativos, bens móveis e imóveis, inclusive, sistemas integrados. Isso facilitou nosso trabalho”, conta Maria da Conceição Barros de Rezende Ladeira, superintendente da Central de Contadoria Geral, da Secretaria de Estado de Fazenda de Minas Gerais.

Para preservar sua estrutura contábil e antecipar as informações de balanço do Governo, o Estado desenvolveu seu novo sistema de forma que a contabilidade anterior fosse mantida, como backup. “Isso reforçou a segurança da validação do processo e nos mostrou os caminhos que precisavam de ajustes no decorrer de 2013”, explica a superintendente.

Hoje, com todas as informações implantadas no sistema, de acordo com a nova estrutura padronizada pelo Governo Federal, Minas tem novas metas. “No final de 2013, fizemos a atualização dos bens móveis e imóveis dos órgãos e entidades do Governo de Minas, tudo avaliado no valor presente. Agora, temos como objetivo a parte de bens de infraestrutura, trabalhar receita por competência e o sistema de custos”, diz.

São Paulo acelera o passo

Também em dia com a STN, o Plano de Contas do Estado de São Paulo foi inaugurado no início de janeiro. “O Estado tem cerca de 1.200 eventos contábeis. Todos foram revistos e adaptados do plano antigo para o novo e isso envolveu cerca de seis mil contas contábeis”, explica Roberto Yoshikazu Yamazaki, coordenador de Administração Financeira da Secretaria da Fazenda do Estado. A estruturação no Estado começou em 2011, quando foi criado um grupo de trabalho interno. A partir de 2013, foi contratada uma assessoria externa.

De acordo com Yamazaki, o maior desafio ainda está a caminho: começar os novos lançamentos agregando o conceito de competência. “Vamos ter de fazer o roteiro contábil para contabilizar os bens do Estado a valor justo.

Conseqüentemente, vamos introduzir o conceito da depreciação, que também não existe na contabilidade pública tradicional”, detalha.

Rio investe na capacitação de técnicos

A Controladoria Geral do Município do Rio iniciou o trabalho de adaptação às novas normas em 2008. “Fizemos estudos para otimizar o fluxo de informações e adequar o sistema contábil, que passou por uma remodelagem para atender à nova metodologia, focada em aspectos patrimoniais. Concluída essa fase, iniciamos a capacitação dos servidores municipais envolvidos, tanto na abordagem teórica quanto no sistema informatizado de contabilidade”, conta Antonio Cesar Cavalcanti, controlador geral do município.

A prefeitura agora implementa o Plano de Contas e Demonstrações Contábeis Aplicadas ao Setor Público. Para 2015, a meta é prosseguir a sistematização das informações e o treinamento de pessoal. “A adequação tecnológica é fundamental, mas a capacitação de pessoas e o comprometimento dos gestores que geram a informação são o centro nervoso do processo”, conclui.

Processo é irreversível

Para as regiões que ainda “patinam” na nova contabilidade, é difícil estabelecer uma orientação genérica. “Alguns Estados dependem de atualizações de sistemas por parte do Serpro – Serviço Federal de Processamento de Dados.

Outros Estados e municípios optaram por sistemas independentes ou, mesmo, pela contratação de serviços de firmas de contabilidade. O importante é observar que o processo é irreversível: todo o setor público caminha para a convergência”, diz Alberto Gergull, consultor da Fipecafi.

Em janeiro, a CNM – Confederação Nacional de Municípios entregou ofício à Secretaria do Tesouro com as demandas dos municípios a partir de diagnóstico da contabilidade municipal. Segundo pesquisa da entidade, 47% dos 3.396 municípios adaptarão os sistemas contábeis ao longo deste ano.

Lembrando que o prazo para a consolidação das contas nacionais é 2015, a entidade manifesta preocupação, pois os municípios que só conseguirem adaptar seus sistemas no final deste ano não terão condições de atender a essa exigência. Para a CNM, a consolidação das contas nacionais deve ser prorrogada para 2016.

Em relação ao Sistema de Informações Contábeis e Fiscais do Setor Público Brasileiro (Siconfi), a Confederação chama a atenção para o processo de capacitação dos contabilistas municipais, e para os entes que não iniciaram 2014 com o novo Plano de Contas. A entidade propôs que seja estabelecido um projeto de capacitação municipal em parceria com a STN. Esta, por sua vez, iniciou a elaboração da sexta edição do Manual de Contabilidade Aplicada ao Setor Público, que será publicada este ano para o exercício de 2015. E já disponibiliza em seu site a consulta para as provisões dos ativos e passivos contingentes, as transações sem contraprestação, reflexo patrimonial das despesas de exercícios anteriores e a receita orçamentária.

Para Alberto Gergull, o estudo detalhado sobre recursos, peculiaridades e tamanho do Estado ou do município é fator determinante para o sucesso no processo de convergência. Outras ações sugeridas pelos especialistas são:

Valorização do time interno– investir em recursos humanos com remuneração e um modelo de trabalho adequados. Além disso é importante manter um time interno, ainda que reduzido, que dê continuidade aos processos, mesmo que eles tenham sido iniciados por empresas terceirizadas.

Gestão integrada e apoio institucional– é essencial buscar o apoio institucional do Governo e da Secretaria de Fazenda para conseguir levantar as informações contábeis de forma completa e alinhada.

Relacionamento– estreitar o relacionamento com a Contadoria Geral da União é importante para poder compartilhar as dificuldades e levantar soluções. Vale ressaltar também a troca de informações com os entes que estão em processo mais avançado.

Fonte: Revista Transparência – IBRACON – 11/04/14